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sexta-feira, 18 de maio de 2012

A língua falada na Globo

Sírio Possenti
Enviado por luisnassif, sex, 18/05/2012 - 09:55
Por Assis Ribeiro
Do Terra Magazine

AS TRANSCRIÇÕES DA GLOBO

Os linguistas que se dedicam ao estudo da língua falada adotam, entre outros procedimentos metodológicos, um conjunto de transcrições destinadas a permitir quer o analista tenha acesso ao que “realmente” ocorreu, a como as pessoas falam “de fato”. As aspas nas duas expressões quase sinônimas significam que, evidentemente, não se trata de um registro cabal, de tudo, mas do que é considerado relevante, como pausas, hesitações, ênfases, simultaneidade das falas etc. Não se registra uma voz aguda ou grave (questão irrelevante), mas se registram as sílabas destacadas pelo falante, independentemente se serem as tônicas em estado de dicionário (a relevância desse fenômeno deve ser demonstrada na análise).

Um exemplo simples: os anúncios do jornal que a rede Globo apresenta de S. Paulo no horário do almoço podem ser transcritos assim: “Veja no JORnal Hoje. É que, invariavelmente, as sílabas iniciais das duas palavras são enunciadas com destaque (ou seja, os locutores dizem JORnal HOje e não jorNAL Hoje). Se produzissem esta última sequência, estariam levando em conta as sílabas tônicas de cada palavra tomada isoladamente. A explicação para a entonação que ocorre realmente tem a ver com ritmo (tônica / átona / tônica / átona), que se sobrepõe à tonicidade original das sílabas. Em outros casos similares, pode tratar-se de ênfase, muito visível em palavras mais longas, como “comPLEtamente impedido” – ou mesmo “COM-PLE-tamente impedido” – em vez de “completaMENte impedido”.

A Globo, em seus programas jornalísticos, às vezes mostra transcrições de falas, especialmente quando seus repórteres vão aos “morros” ou quando a Polícia Federal abastece o noticiário. Nestes casos, invariavelmente, a emissora destaca, entre aspas ou em itálico, as formas que estão em desacordo com a norma escrita. Se alguém disser “vamo pegá” em vez de “vamos pegar”, a Globo coloca a expressão entre aspas (aqui, estou citando, por isso as duas formas estão entre aspas).

Em tese, nada contra. A questão são os critérios. A Globo mistura duas coisas: coloca entre aspas tanto as formas socialmente marcadas (digamos: mermão, eles vai entregá) quanto as formas que não são mais marcadas, na fala, como os infinitivos sem r final (fazê) ou monotongos no lugar de ditongos (poco, pegô).

Além disso, ou por causa disso, a emissora não vê que também os ocupantes da bancada falam segundo estas regras. Basta ver a diferença que existe entre o que leem e o que falam entre si ou com seus repórteres. Anotei, em uma edição do jornal, entre outros, os seguintes dados. LENDO: vai ver, conhecer, se entregou, ajudou, pegou, a seguir etc. FALANDO: chegô (chegou), pidí (pedir), é tê (é ter), pras pessoas (para as pessoas), se tê (se ter), pra que o organismo (para que o organismo) etc.

A emissora apresenta até mesmo um quadro a que chama TÔ DE FOLGA, cujo título vale por um programa ou uma tese: quando se fala cerimoniosamente, usam-se certas formas (as citadas acima entre as lidas servem de exemplo); quando se fala informalmente (quando “se tá de folga”), usam-se outras formas (exemplos são as citadas acima como faladas).

É assim que é, mesmo nos jornais da Globo, e, claro, em toda a programação da emissora. E também das outras. Quem não acredita pode assistir aos programas com papel e lápis. Verá o que se diz de fato. Os critérios para uso de aspas ou itálico deveriam ser mais refinados.

Qual é a bronca implícita neste textinho? É que Globo só dá destaque às falas que considera incorretas quando os falantes são do morro ou são aqueles cujos telefonemas a polícia gravou. Não aplica os mesmos critérios a suas falas. Se ouvisse a si mesma, diminuiria as formas marcadas na telinha. Por que ela faz como faz? Ou não se dá conta, o que é ruim. Ou se dá conta e marca negativamente os de sempre, o que é pior. Cadê a famosa fonoaudióloga da Globo?

*** Gianotti, no Roda Viva (07 de abril), discutindo o papel da filosofia (e da Universidade), declarou-se a favor da “massificação”, mas defendeu que é preciso que haja pesquisas de ponta, um “Vale do Silicone” (!!!) da filosofia. Se a expressão tivesse sido empregada por algum ator, apresentador, cantor popular, jogador de futebol (ou por Lula?), o registro da gafe teria bombado nas redes sociais. Como se trata do ilustre filósofo, cujas opções políticas são mais do que claras, o fato passou em branco. Ou será que ninguém percebeu? Na bancada, ninguém fez caretas…

*** Neymar corre o risco de ser mesmo uma espécie de Pelé: ótimo no campo, um horror fora dele. Chegou-se a distinguir Pelé de Édson (um ótimo Pelé, um péssimo Edson Arantes, disse Ziraldo). Neymar já declarou que não é negro (faz um bom tempo, era quase uma criança) e que seu sonho eram uns carrões na garagem. Agora, dança num clip de Alexandre Pires (e Mr. Catra). Aproveito a deixa para uma avaliação sumária do clip, já que foi até mesmo alvo de manifestações duras, tanto por supostamente tocar em questões raciais quanto por “explorar” uma certa imagem da mulher: não acho que se trate de uma peça racista e não sei se seria machista. É só ruim, ruim de doer. As moças são bonitas, mas são péssimas dançarinas. A letra é cretina, boboca (“é no pelo do macaco que o bicho vai pegar”!). O que o Neymar estava fazendo lá? Talvez eu volte a esse caso.

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